Marcelo Miranda: 2016 não terá benefícios
Governador disse ainda que sabe conviver com a atual fase de rejeição e promete que gestão vai melhorar este ano
01/01/2016 06:00
Aline Sêne e Cléo Oliveira
Palmas
Sem jogo de palavras ou eufemismos, o governador Marcelo Miranda (PMDB) deu um veredicto que soará assombroso ao funcionalismo público: em 2016 não haverá nenhum aumento, de qualquer natureza. “O governador já bateu o martelo sobre isso, pode colocar”, disse ele mesmo, em entrevista ao Jornal do Tocantins.
A decisão é um catalizador na rejeição que a atual gestão estadual sofre com quem move a máquina pública, os servidores. E Marcelo demonstrou estar ciente disso.
A baixa popularidade vivida por ele hoje, a menor desde que entrou para a política, há 20 anos, até agora, foi um dos temas abordados, entre outros: erros e acertos na gestão, críticas de ex-aliados e a situação da instabilidade financeira e econômica que amarra o Estado. Observado por dois secretários estaduais, Rogério Silva (Comunicação) e Geferson Barros (Administração), Marcelo não se furtou a nenhum dos questionamentos.
O jeito tranquilo já é característico de Marcelo e não aparenta artificialidade. Mas a equipe do JTo encontrou um governador diferente dos “Marcelos Miranda” de gestões anteriores. O de agora demonstrou estar mais seguro e centrado, ainda que sua gestão não tenha começado, digamos, pra valer!
Pela primeira vez, Marcelo falou publicamente sobre o período em que esteve no limbo da política com a cassação de seu mandato, em 2009. “Me abalei”, confessou. Ele também falou sobre o risco de nova cassação devido a processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e revelou os planos que tem para “a verdadeira mudança” no Tocantins, de fato, começar. Veja, a seguir, os principais trechos dessa entrevista. Hoje, no Jornal Anhanguera 1ª edição da TV Anhanguera, a partir do meio-dia, assista também à entrevista que o governador concedeu ao jornalista Sydney Neto.
2015 foi um ano de crise e o governo anunciou medidas ao longo do ano. Mas, o que realmente foi feito pela gestão estadual?
Esse terceiro mandato de governador está sendo muito desafiador. Não sabíamos, primeiro porque tivemos uma transição assim um tanto traumática e não tivemos acesso às informações que poderíamos ter, que entraríamos dia 1º de janeiro (2015) sem orçamento. Estávamos discutindo o orçamento e detectamos uma dívida com os servidores públicos, que foi a folha de pagamento de dezembro, mais de R$ 260 milhões. Imagina você ter que planejar um ano, que pagaria 13 folhas, que passaria a ter 14 folhas. E isso gerou uma grande dificuldade ao longo do ano para que pudéssemos chegar ao final 2015, graças a Deus, com o salário em dia. Imagina a data-base que foi de 8,34%, tivemos que dividir em duas vezes, isso também pesou o pagamento das folhas, gerou um desequilíbrio, mas nós tínhamos que fazer. Porque foi um compromisso que assumi com os servidores públicos, o pagamento da data-base. Houve-se crise, houve-se greve em alguns setores, mas depois de muitas conversas, com a equipe não fugindo do debate, conseguimos debelar as greves. Chegamos ao final do ano, uma greve na saúde. Uma greve que não dá para entender, se as coisas estão praticamente em dia. Nós procuramos acertar alguns passivos dos anos anteriores. Na questão das progressões, faltam duas parcelas das progressões da educação referentes a 2013. Todas as categorias tiveram progressões. Procuramos honrar compromissos, inclusive sem olhar o que ficou da gestão anterior. Tivemos problemas sérios e até incompreensões, mas a equipe não faltou nesses momentos. Mas, infelizmente, alguns setores parecem que não entenderam.
Houve algum problema nesse primeiro ano de governo que não esperava?
Na área da saúde, acreditava que era possível avançar muito mais, dar um choque de gestão de verdade. Vou dar o exemplo do Hospital Geral de Palmas, haviam vários fornecedores sem receber; a reforma do prédio tinha sido iniciada, mas teve que paralisar porque os recursos estavam dentro do financiamento com o Banco do Brasil, o Pró-Estado II, que agora em 2016 terão os recursos liberados, mas não será suficiente. Na construção do Hospital Regional de Araguaína encontramos só a terraplanagem. Foi lançada a construção do hospital de Araguatins, mas não saiu do papel. A reforma e a ampliação do hospital de Augustinópolis estamos terminando agora. As obras do hospital de Gurupi estão sendo feitas, mas com muita dificuldade. Deparamos mais uma vez com a falta de medicamento, pois os fornecedores não haviam sido pagos. Os recursos para o SUS estão defasados e temos a questão que os estados vizinhos encaminham os pacientes para o Tocantins. Não vamos fechar as portas para quem chega, mas isso tem custo. O que fazer? É nos unirmos ao governo federal e aos governos municipais e buscar mais recursos.
Oposição e aliados têm cobrado uma reforma administrativa. O senhor fará mudanças em 2016?
No início de 2015 fiz uma reforma administrativa, em 2014 existiam 66 órgãos entre secretarias e autarquias, quando assumi em janeiro tinha 49 órgãos no geral, então diminui muito pouco. Nossa meta é diminuir mais ainda, fundir secretarias e autarquias, mas têm algumas pastas que não podem ser extintas por causa de convênios. Mas tenha certeza que farei essa reforma administrativa, vou só esperar a Assembleia voltar. Podia fazer por medida provisória, mas prefiro fazer por projeto de lei para que a Assembleia possa discutir junto conosco essa reforma. Também fizemos uma redução de mais de 3 mil servidores, entre comissionados e contratados, no ano passado.
Um desafio para este ano será o governo reduzir o gasto em despesa com pessoal. Como será?
Os servidores efetivos pesam muito mais que os comissionados. Na área da saúde, foram extintos 3 mil contratos. Vocês imaginam tirar, que sejam 1.500, que caos ficaria a saúde. O que se pesa, e aqui não vou tirar os direitos dos servidores, são as vantagens que foram dadas. Não tiro a responsabilidade do meu governo passado não, eu também o fiz (concedeu benefícios aos servidores), mas havia equilíbrio financeiro, mas os benefícios continuaram nos governos posteriores. O servidor efetivo não pode ser exonerado, é lei, mas só o enxugamento da máquina não irá resolver, pois tenho 36 mil servidores efetivos e 14 mil comissionados e contratados. Agora, este ano será de contenção de despesas. Não haverá aumento para setor nenhum, para nenhuma categoria, não temos como fazer. O governador já bateu o martelo. Em relação à data-base, haverá um estudo.
O senhor sempre foi tido como o “pai do funcionalismo público”, mas essa relação ficou estremecida em 2015. Como o senhor lida com essa baixa popularidade?
Recebo as críticas construtivas de forma natural, como um incentivo para melhorarmos ainda mais a administração. E o tratamento ao servidor público praticamente não mudou em nada. O governo está em dia com o pagamento dos salários, eu acho que já é uma vantagem. Já imaginou se os salários estivessem atrasados? O servidor ficou sem receber a folha de 2014, entrei no governo e paguei a folha em janeiro, praticamente paguei duas folhas em um único mês. Eu acho que não deixei de olhar com bons olhos os servidores públicos. Agora, ninguém resolve os problemas do dia para a noite. Tenho procurado honrar os compromissos que fiz com os servidores, se não honrei tudo aquilo que não foi honrado nas gestões anteriores é só olhar o cenário nacional. Porque só há desemprego, desemprego, desemprego. Continuo sendo fiel aos servidores públicos, mas àqueles que não estão entendendo o momento digo: estamos pagando os salários em dia, não parcelando 13º e agora em janeiro vou terminar de pagar o 13º e a folha de dezembro. Apesar de alguns passivos que ainda estão atrasados.
Como defender os aumentos dos impostos?
Uma coisa é que não fugimos do debate. O ajuste fiscal foi muito bem discutido, onde houve uma queixa maior foi em relação ao IPVA. A Assembleia Legislativa, em consonância conosco, voltou atrás e aprovou uma nova alíquota do IPVA para alguns setores. A questão do ICMS foi muito bem discutida. E o governo do Estado está aberto para novas discussões. Nós não fechamos as portas. Nós aprovamos um ajuste que não foi a contento, já recebi empresários que querem rever algumas questões e nós abrimos para o debate. Estou convivendo harmonicamente. Não fugimos dos desafios com os empresários, estamos abertos ao diálogo. Temos que voltar a ter no Estado novos investimentos, que os investimentos voltem a aflorar no Estado na geração de emprego e renda.
Como foi a decisão sobre o pagamento do 13º salário?
Mais uma vez quero dizer, minha administração é muito transparente. Se não demos conta de chegar a 100%, mas em janeiro todos serão pagos. Mas, estamos com salário em dia. Priorizamos os servidores que recebem abaixo de quatro salários mínimos e atingimos 35 mil servidores, não foram possíveis pagar todos em razão das frustrações de receita, principalmente do FPE (Fundo de Participação dos Estados) que ultrapassou R$ 300 milhões.
Houve uma falha de comunicação em relação ao 13º? Pois o governo até o dia 19 sustentou que pagaria a gratificação no dia 20, mas na noite anterior à data do pagamento foi anunciado que parte receberia em dezembro e outra janeiro.
Eu não fujo da revolta, houve uma frustração até para mim mesmo que esperava pagar. Eu assumo o desgaste, mas o pior é se não tivesse pagado nenhum real e ainda ter parcelado o 13º salário. O que me deixa mais tranquilo como gestor, mesmo sabendo que há falhas na administração, é saber que pago o salário em dia. O que revolta um gestor público, e não estou aqui para desmerecer nenhum servidor, e ver servidores públicos debaixo de uma tenda jogando dominó durante o dia (no horário de expediente). Isso é que dói em mim, dói quando estou vendo um paciente na porta de um hospital em uma situação adversa, mas o salário do servidor está em dia, e ele poderia atender o paciente, não que ele não atenda. Porque nós temos bons profissionais, acredito que é a maioria, não estou aqui para generalizar, eu sou muito grato aos servidores do Estado. Frustração é quando vira as costas, frustração é quando você vai para a casa e diz: puxa vida não cumpri nem com pelo menos dois pais de família. E o governador Marcelo Miranda tem procurado cumprir com os pais de família, mesmo com muita dificuldade.
Como o senhor definiria esse primeiro ano de governo?
Os pontos positivos são poucos que falam. No programa das carretas da saúde não perguntei as pessoas que estavam sendo atendidas a que partido pertenciam, quem era o filho, quem era o pai. Pelo contrário, o que vi foi pais e mães de família com as mãos calejadas e as canelas finas de tanto lutar na vida. E este programa, que já foi contestado, foi feito em vários estados e foi um grande sucesso. Essas coisas boas têm que falar, como em Mateiros que levamos água tratada, localizado lá em Jalapão. O aeroporto de Mateiros estava em construção, mas o recurso foi contingenciado. Na área de saúde, dizem por aí que estão morrendo milhares e milhares de pessoas, levantamos o número de óbitos e está menor que o de 2014. Queríamos que não tivesse tido nenhum óbito, mas os índices, os médicos, os profissionais estão procurando salvar vidas, mesmo tendo dificuldades. Contraímos agora R$ 300 milhões com o Banco Mundial que é para restauração das rodovias, o Crema, onde tivemos quatro lotes de licitação, e o recurso deve ser liberado nos próximos meses. E temos o PDRIS, que já está em andamento e é para fazer a recuperação das estradas vicinais. Precisamos do recurso com urgência, pois com as chuvas as estradas ficam com muitos buracos e por isso, com dificuldade, estamos fazendo a recuperação de algumas rodovias. Tem alguns setores que nós avançamos, por exemplo o agronegócio, que é o carro chefe do nosso Estado. Procuramos avançar em alguns setores, como a extensão rural. Estamos recuperando os projetos São João e Manuel Alves. O recurso do Pró-Estado I, que foi aplicado na recuperação e pavimentação de rodovias e vias urbanas, foi liberado e dívidas do governo anterior estão sendo saldadas com as empresas. Então nós temos que avançar em outros setores. A segurança pública, temos demandas demais também.
Algum secretário ou presidente de autarquia o decepcionou como gestor?
No dia que tomei posse dei um prazo de um ano para os secretários atingirem as metas e todos, por unanimidade, colocaram os cargos a disposição em dezembro. Estou à vontade para fazer as alterações. Eu também tenho frustrações, eu queria que minha gestão tivesse sido bem melhor, mas eu reconheço as falhas. Eu preciso é de parceiros para ajudar.
A ministra Kátia Abreu (PMDB) avaliou a sua gestão como pouco ousada e disse não ter visto medidas eficazes para combater os problemas. Como o senhor recebe as críticas de uma ex-aliada política?
As críticas à gestão, recebo como um incentivo para trabalhar mais. Ocorreram falhas e estou consciente disso. Quero continuar trabalhando, com bons parceiros, e reverter esse cenário. Governar não é fácil para ninguém.
Governador houve um rompimento no dia 1º de janeiro de 2015. O que aconteceu?
Acho que isso já é matéria vencida. Já fiz uma visita institucional à senhora ministra, já a recebi aqui em nosso gabinete. Discutimos projetos para o agronegócio junto com minha equipe de governo, sempre receptiva dos dois lados. Estive em um jantar em sua casa, quando a presidente Dilma esteve no Tocantins. Acredito que a nossa relação institucional é em função do Tocantins e em função do Brasil, não vejo que isso nos prenda a qualquer coisa. Acho que é matéria vencida e temos que olhar para frente.
Em relação a possível candidatura da vice-governadora Claudia Lelis (PV). O senhor chegou a falar com ela sobre isso?
Eu já chegue a falar com ela. Agora ela tem uma função comigo de ajudar a governar o Estado, mas ela tem todo o direito também de se dedicar a um projeto que traduz um sentimento do PV. A gente respeita, mas vejo que ainda é cedo para essa discussão, temos que ter tranquilidade para não fechar as portas. Todo mundo tem o direito de ser, mas também precisa entender o momento e não se precipitar. Não estou dizendo que ela está se precipitando, mas o momento agora é pensar no Estado.
Nesse mandato o senhor também enfrenta um processo de cassação. Qual a sua avaliação, é um tema que assusta?
Passei a estar mais presente com os meus filhos, a viajar para o interior do Estado, visitando os companheiros. Comecei a fazer as visitas, sendo que a primeira foi em Silvanópolis e rodamos o Estado todo de carro. E por isso fui para a eleição do Senado com uma base, que meu a vitória. Então estava na planície e passei a ter mais tempo de visitar e fazer reuniões, sempre acompanhado da minha mulher e amigos. Passei a reconhecer os verdadeiros amigos e companheiros. Eu fiquei abalado, mas as vitórias que vieram depois me confortaram. O processo me incentiva a trabalhar muito mais. Ganhamos, mas os meus adversários não entenderam que ganhar as eleições é no voto. Eu jamais, se perdesse uma eleição, iria contestar minha derrota, a não ser que fosse algo muito grave. Obtive a vitória nas urnas e no primeiro turno. Estou tranquilo, sereno e confiante que mais uma vez vamos continuar merecendo o apoio da população, mas precisamos melhorar mais ainda e estou seguro que faremos uma administração digna e honrada.
O que os tocantinenses podem esperar para 2016?
Vamos buscar parceiros e investimentos para a infraestrutura do Estado. Temos que melhorar mais a saúde e muito e será por meio da gestão própria, será gestão privada, nós estamos estudando, isso não vou negar. Existe ventilando tudo que é possível para melhorar a nossa saúde, inclusive uma possível terceirização. Na área educacional, estamos retomando as obras das escolas. Faremos a reforma de 14 escolas, sendo R$ 1,9 milhão para cada unidade. Assinamos um TAC (Termo Ajuste de Conduta) com o Banco Itaú para equipar 130 bibliotecas e investir mais na área pedagógica. Sabemos das demandas da segurança pública e o início do estudo do concurso para a Polícia Militar. Assumimos o governo com 12,5% das cisternas instaladas e encerramos o ano com a entrega de mais de 9 mil cisternas. Na habitação, entregamos 242 unidades em Palmas e detectamos problemas na execução do Minha Casa Minha Vida em 122 municípios.